quarta-feira, 28 de abril de 2010

Recomeçando no Caparaó - parte 2

O relógio despertou como programado às quatro da manhã mas meu corpo ignorou e continuou em sono profundo. Acordei preguiçosamente quase sete da matina. Meu café da manhã antes da montanha inexiste, geralmente não como nada. Desta vez foi somente 2 chocolates BIS. Levei comigo na mochila mais meia dúzia como lanche de trilha, suco de tangerina e água no reservatório, total de quatro litros de líquido.

Depois de arrumar tudo saí da barraca, era 07:15h quando comecei a andar. Pra que pressa? Não precisava disso, lugar no camping não seria mesmo o meu problema. Acredito que o maior problema seria a gang de Quatis ladrões que lá existe (risos). Minha intenção era começar com o nascer do sol no Bandeira como todo mundo faz. Mas como já estava tarde decidi mudar meus planos. Encontrar a trilha pro Cristal e atacar primeiro esta linda montanha, na minha opinião, a mais bela do parque. Até então eu acreditava que seria a mais difícil, me enganei.

Sem pressa, parando para fotos, segui trilha acima. Utilizei os dados pra gps que peguei baixando do site do Tácio, que por sinal estavam bem precisos. Fica aqui o agradecimento ao Tácio, valeu!

Quando cheguei no poste no grande platô que se impõe acima do camping e de frente pro Morro da Cruz do Negro, deixei o gps desligado, mirei pro Cristal e fiz uma linha reta. Sem preocupação com tempo que estava limpo, céu azul com brisa leve, por isso boa visibilidade pra observação de marcações, tudo ótimo.

Atravessando pequenos desníveis de subida e descida logo cheguei a um imenso platô que fica na lateral do maciço do Bandeira. Dali a visão do Cristal é bastante privilegiada e os totens, bem, faço do Tácio minhas palavras: Exagero! Totem a cada cinco metros com um terreno de lajeado de pedra sem vegetação. Pra que? Desnecessário. Mas tudo bem, vamos em frente que atrás vem gente. Opa, não vinha! Ahahahahah

Chegando na beirada do imenso platô de uns bons 500 ou 600 metros dei de cara com um vale bem grande. Não havia saída, o único jeito era atravessa-lo para chegar ao meu objetivo. Fazia um calor dos infernos, uns 25 graus. Eu suava tremendamente e tinha que secar a testa a cada minuto. Não é exagero, fiquei com uma camiseta pendurada no pescoço e passava tanto ela na testa que acabei esfolando a pele, que foi mais maltratada ainda pelo sol. Esqueci o protetor solar na casa da lili. Maravilha hein?


Um baita vale pra atravessar e o Cristal no fundo


Quase desanimei, pensei por dois minutos em voltar e fazer a travessia do cume do Bandeira que eu nem sabia se era possível. Afinal se contas, não pesquisei nada para esta viagem porque baixei o arquivo do Tácio, estava tranqüilo em relação a isso. Decidi ir olhando a previsão do tempo que prometia, então comprei a passagem e caí na estrada.

Mas então resolvi olhar mais atentamente os totens. Mais, observei que no vale tinha muita sombra pra caminhar já que ainda era cedo. Segui o primeiro totem, o segundo, o terceiro...e assim foi até que ele me levou pra beirada do platô que desce a um ângulo de 30 graus entrando na vegetação de altitude mediamente rasteira, recheada de caraguatá. Alguns metros adiante, outro totem.

Me surpreendi, havia uma trilha e muito bem marcada. Apesar dos pesares, o Pico do Cristal é bastante popular dentro do parque. A partir daí entendi a razão pela qual o guia não conhece o Tesouro e o Tesourinho, todas as placas informativas e folhetos do parque só destacam o Pico do Bandeira e o Pico do Cristal. Sequer citam o Cruz Negro que é a montanha mais fácil do parque, a somente 970 metros em linha reta do terreirão.

Segui a trilha. Depois de cinco minutos nem olhava mais pras pedras, a trilha era bastante definida, seguindo em linha quase reta pro fundo do vale. Chegando lá no fundo dei de cara com um rio, sempre tem um rio...Mais totens me informando o caminho e foi certeiro, um monte de rochas enormes fornecia só um lugar onde a travessia era segura e seca por ali. Dali comecei a subir novamente o vale.

Mais lajeados repletos de totens, mais e mais, até que eles começam a virar a esquerda sentido crista. Ali eu saí dos totens e fiz meu próprio caminho continuando em linha reta pra base do Pico, onde cheguei sem nenhum problema. Olhando para trás vi mais uma coleção de totens vindo pela crista, foi quando me dei conta de que a travessia é não só possível, como bastante freqüentada.

Da base dele até o cume foram só cinco minutos. A vista do Cristal é espetacular, na outra ponta sentido cidade há uma outra montanha que acredito ser o Pico do Camilo, mas não estou seguro. Também não sei sua altitude e nem encontrei referências online. Cheguei no cume do Pico do Cristal de 2.769 metros de altitude às 09:30h. Levei no total 2h e 15m da barraca até lá. Muito bom levando em consideração a dor tremenda na virilha e o que eu esperava, pelo menos 4 horas incluindo vara mato, que nem de longe aconteceu.


Este solitário no cume do Pico do Cristal, 2.769 metros de altitude.


Fiquei no cume pouco tempo, só uns dez minutos. Suficiente pra fazer a foto de cume com meu tripé pequeno porque o grande ainda está com o Edson, fazer um vídeo do cume, uma panorâmica das montanhas menores na faixa dos 2000 metros do lado capixaba, e olhar pela minha pequena luneta pra crista observando a rota. Desci e fui embora.

Cerca de 50 minutos depois eu estava no cume do tal do “Pico 2”, de 2.852 metros de altitude. Pico ainda não reconhecido pelo IBGE e que não faria falta mas, já que criaram a controvérsia, pisei lá. Ali não fiz foto de cume, mas fiz uma panorâmica da paisagem e uma foto do Bandeira. Levei uns 3 minutos no cume. Continuei e fui embora até o cume do Pico do Calçado.


Bandeira desde o cume do tal do "Pico 2" a 2.852 m.


Este sim eu até concordaria com a idéia de homologação do IBGE. Mas só este. Não é tão colado com o Bandeira e tem altitude de 2.849 metros. Ali sim fiz foto de cume até porquê já trataram de fazer um totem lá com um pedaço de madeira. Também fiz uma foto do Cristal de lá que ficou linda...


Cristal desde o Calçado.



Eu no cume do Calçado. 2.849m.


Continuei e dali pro Calçado Mirim mais uns vinte minutos como sempre parando, fotografando, secando o suor, esfolando a testa...Outro “cume” desnecessário. Um ombro do próprio Bandeira que faz de fato um mini cume, mas não passa de um morrinho do Bandeira. De novo: Já que inventaram a idéia, pisei lá no “cume” a 2.818 metros de altitude. Só um auto retrato.


Auto retrato no "Calçado Mirim". 2.818m. Cristal ao fundo.


Segui pro Bandeira onde cheguei apenas 15 minutos depois. Ainda era 11:30h! O tempo que eu acharia que levaria pra fazer cume somente no Cristal, levei pra fazer a travessia oposta ao tradicional (que eu nem sabia que era feita) fazendo os cinco cumes que na verdade são só 3. 2 são invenções que ainda não se sabe se o projeto pontos culminantes vai ou não homologar.

Fiz foto de cume, vídeo com 360 graus, o engraçado é que no próprio vídeo eu não reconheço o “Pico 2” e nem falo dele, ainda termino o vídeo falando que fiz os 4 cumes em 4 horas. Ê laia...rs. Fiz mais uma panorâmica, sentei, descansei, sequei o suor...Desfrutei da paisagem da terceira montanha mais alta do Brasil. Fiquei ali por meia hora. Ainda avancei até a parede oposta do Bandeira pra ver se rolava uma descida direta até o colo dele até a Pedra Roxa, mas quando cheguei lá, apesar de achar possível, muitas nuvens já se aproximavam e, temendo pela possibilidade de ficar “molhado no mato”, resolvi voltar cedendo à dor da virilha e à fome.


Com a ajudinha do pequeno tripé saiu a foto de cume no Pico da Bandeira. 2.892m.


É isso mesmo, quando o relógio me avisou que era meio dia o estômago alertou, fome! Dei vinte no burro e comecei a descer. Só parei em um ponto de água pra reabastecer meu reservatório e segui sem olhar pros lados. Muitas nuvens no céu até que não havia mais sol, ventava mais forte e a possibilidade de chuva na minha cabeça aumentou de 5% pra 40%.

Cheguei no Terreirão as 12:50h. Um pouco cansado mas satisfeito com o rendimento. Fiz meu almoço que incluía lombinho suíno (ará!!! Isso mesmo leu certo! Levei dois bifes de lombinho suíno pra montanha!) que fervi duas vezes na água pra tirar o excesso de sal, depois fritei e coloquei junto de um macarrão. Rapaz comi feito rei na montanha...

Sim claro, o camping? Vazio. Só tinha um Quati enorme zuando com um tambor de lixo, um dos que eu catei tudo e organizei. Ele conseguiu virar o tambor, abrir e tirar TODO o lixo lá de dentro...k7...

Limpei tudo de novo depois de lavar minha louça, trocar de camisa, lavar as duas suadas e colocar sobre a barraca. O sol voltou a brilhar, já era quase cinco da tarde quando me posicionei na pedra ao lado da casa de pedra pra esperar pelo pôr do sol, cansado mas já sem dor na perna...Fiquei ali escutando uma coletânea de músicas orquestradas e clássicas por longas duas horas. Mesmo depois que o sol se foi continuei lá mais um pouquinho.

Voltei pra barraca, fiz minha feijoada pra janta (segunda lata) e li a revista, só fui cair no sono depois das dez horas.

Acordei no dia 27 menos preguiçoso e mais disposto, era só 6 da manhã. Para esta manhã eu havia planejado subir o Cruz Negro e se fosse possível esticar até o Tesouro e Tesourinho, a caminhada mais longa do parque. Levantei e saí da barraca pronto em dois minutos. Ainda ninguém no camping comigo.

O tempo estava uma porcaria, totalmente nublado. Não encobria as montanhas mas as nuvens estavam baixas o suficiente pra quase encobrir os cumes. Fui assim mesmo.

Comecei a subida pela mesma trilha do Bandeira até que saí pela esquerda seguindo instruções dos dados registrados pelo Tácio. Quando cheguei no poste que fica de frente pra montanha, novamente desliguei o GPS e fui embora. O único diferencial é que não há totens por ali e a trilha inexiste, mas a vegetação é baixa suficiente pra se ver onde pisa 100% do tempo então fui tranqüilo.

Subi a encosta feito uma máquina preocupado com o risco de chuva e de não ter visual lá em cima. Em pouco tempo já estava no topo do maciço do morro, ali sim alguns totens indicavam o caminho porém também desnecessários, já que o caminho é mais do que óbvio.

Chegando no pré cume há um totem com um tijolo riscado com o dizer: “Pico Brownsea” (wtf???). Continuei e cinco minutos depois estava no cume do Morro da Cruz do Negro, a 2.658 metros de altitude, olhando o Tesourinho e o tesouro ainda bem distantes. Olhei para o relógio e ainda era 07:14h, olhei pro céu e além de bastante vento, nublado. No horizonte bem distante até era promissor, mas decidi abortar a ida até lá.


Auto retrato no Morro da Cruz do Negro. 2.658m. Tesourinho e Tesouro ao fundo.


Primeiro porquê o tempo estava ruim, eu correria o risco de me esgoelar pra chegar lá (em linha reta o Tesouro dista do C Negro 4,8kms, imaginem em trilha...) e não ver nada. Além disso, se eu o fizesse o que sobraria pra próxima visita? Só a Pedra Roxa. Decidi voltar pra casa feliz com os cumes e deixar o gostinho de quero mais pro inverno que está aí batendo em nossas portas. Fiquei no cume dez minutos pra fazer auto retrato, panorâmicas, um vídeo e foi isso.

Desci com o dobro de velocidade e cheguei no camping as oito da manhã. Arrumei tudo na mochila e quando era oito e meia comecei a descer.

Pra baixo todo santo ajuda mas muito pra baixo...Sem locomoção é complicada essa caminhada, desgasta e desgasta muito. Além disso eu estava triste porque não tinha conseguido nenhum inseto pra fotografar, mas andando pela estrada meu olhar biônico foi atraído por uma espécie de vespa azul morta na beirada junto ao barranco. Ela só tinha uns 2 centímetros mas o azul era tão intenso que chamou minha atenção, fotografei e segui.


A tal da vespa, sei lá a espécie!


Depois de uns 12 kms de caminhada cheguei na praça da cidade ao meio dia, bem cansado, banhado em suor. Pra piorar quando eu cheguei na portaria do parque veio um vento mágico e limpou o céu ahahahahha, parece piada mas foi isso aí rs. Céu azul.

Peguei o ônibus de 1h pra Manhumirim e lá peguei um de 17h40m pra São Paulo, chegando aqui nessa desgraça quase oito da manhã depois de um abençoado trânsito na marginal. São Paulo é uma maravilha...

Nunca pensei que fosse dizer isso mas, gostei mais do Caparaó do que do PNI!

Abraços a todos,

Paulo.

6 comentários:

Beatriz disse...

poxa, pauleca, tu me bota cada pilha!! o próximo parque nacional vai ser o caparaó, podes crer!! abração!!

Jefferson Luis Bellenda disse...

Fala Parofes
Nossa nem sai da Bolivia e ja to com vontade de conhecer nosso Brasil...cara por isto que tu detona, nao para de subir montanhas!!!
Abrazos e Suerte

Carol Emboava disse...

Maravilha de relato! Estou indo pro PNCaparaó em julho e montando minha programação... cheguei no seu blog por uma busca no google sobre o Pico do Tesouro.

Tb já tinha pego os pontos de GPS no site do Tacio!

:)

Paulo Roberto - Parofes disse...

Valeu você pela leitura do relato, pena não poder te ajudar bastante porquê afinal de contas não fui lá. Ficou pra próxima!
Você tem muita foto legal no multiply, tá andando bastante hein!
Parabéns pelas fotos e pelas pernadas!
Abraços
Paulo

Wéll Bericat disse...

Muito Bacana o Relato em Paulo, Parabens por mais essa pernada!!!!
Abraços
Wéll

Fábio disse...

Olá gostaria de convidá-lo a conhecer meu trabalho através do blog Ecos do Teleco Teço (WWW.ECOSDOTELECOTECO.BLOGSPOT.COM) . Grande abraço e sucesso com sua proposta !! Axé