segunda-feira, 18 de agosto de 2008

De volta a Minas Gerais...

Bem, fui para um objetivo mais light dessa vez porque estaria em solo. Dessa vez fui ao encontro do Pico do Lopo na Serra do Lopo, localizado em Extrema – MG. A Serra (como todas) é linda, e durante a trilha observei formações rochosas lindas, o que foi bastante empolgante.

Saí de São Paulo direto do trabalho pra Tietê, e de lá peguei meu ônibus até Extrema, chegando na cidade às 21:00h. Imediatamente comprei a volta pra domingo às 17:30h e no próprio guichê peguei informações sobre a trilha do Pinheirinho, primeiro problema...

Como de costume, eu acabo sempre fazendo o mais difícil e só me prejudico com isso he he he...Seguindo orientação do cara do guichê, comecei a subida da estrada da Torre da Embratel onde supostamente começava a trilha.

Andei de 21:20h até 00:30h e ainda não havia chegado a torre! A mochila com seus 21kg ficou difícil de aturar mais, e sem jantar, exausto por caminhar em estrada cheia de pedras, terra, ou em outros momentos paralelepípedo eu cansei, resolvi bivacar na estrada mesmo porque sozinho, a empolgação de montar a barraca era zero...Tirei da mochila meu isolante, e foi só isso. Deitei e dormi muito mal, por poucos trechos de tempo.


(Local onde bivaquei)

Levantei às 05:30h e comecei a andar. Estava a apenas 150m da torre mas não via porque era noite! É mole? He he he...

Enfim, quando cheguei lá, peguei minhas anotações e reli. Errado! A trilha que saia da torre na verdade era a de chegada! Eu não havia chegado no início da trilha do Pinheirinho e sim no final! E a estrada que levava ao início da trilha (ao lado na entrada da pousada Céu da Mantiqueira) ainda subia mais!


(Amanhecer na Serra do Lopo)

Lá fui eu, me ferrando pela info errada que peguei na rodoviária...Depois de mais uma hora e meia de subida finalmente cheguei na entrada da pousada, onde de fato começava a trilha no lado esquerdo. Dei uma descansada de 15 minutos, e me preparei. Polainas, bastões e fui...

(Eu no começo da trilha, ainda em frente a entrada da Pousada)

A trilha é bem fácil, porém traiçoeira. A mata é extremamente úmida, o que torna o chão fofo e muito escorregadio. As vezes eu pisava e meu pé afundava completamente em lama, escorreguei umas cinco vezes...Bastões de caminhada são muito importantes, e como a mata é propícia pra animais peçonhentos, achei apropriado usar as polainas, foi bom!

Com meia hora de trilha passei pela Pedra dos Cabritos. O interessante é que eu sabia que ela ficava na trilha mas não tinha certeza de que havia passado por ela...Hoje, após fazer o relato e ver fotos, descobri que de fato passei por ela! Legal...rs...Pedra dos Cabritos, 1.611 msnm, também pisei lá!

Após 65 minutos cheguei ao platô enorme de sei lá, cerca de 1 km² que é a Pedra das Flores, a 1.700 msnm. É linda, com pedaços totalmente planos, ideal para camping. E dá pra muitas barracas, muitas mesmo...


(Eu no cume da Pedra das Flores - 1.700msnm)

(Eu no cume da Pedra das Flores e o Pico do Lopo ao fundo)

Dei uma descansada, me hidratei, e continuei pro Pico do Lopo, chegando em sua base apenas 25 minutos depois.


(Eu na escalada final pro cume do Pico do Lopo)

Na base dele há uma pedra enorme (o pico é um amontoado de pedras gigantes) e sob ela rola uma pequena caverna que foi providencial, lá deixei meus 21kg de carga e fiz a escalada sem o peso. A escalada é fácil, apenas cinco minutos são suficientes pro cume do Pico, mas tem uns trechos que devem atingir uns 70° de inclinação e a mochila iria ser uma complicação...

(Eu no cume do Pico do Lopo - 1.780msnm)

Quando cheguei no cume do Pico do Lopo (1.780 msnm) tirei algumas fotos da represa de Joanópolis (Represa Jaguary), de Extrema, de Joanópolis, da Pedra das Flores vista de lá, porém tudo sentado. O vento era tão forte que era difícil ficar de pé...Não quis arriscar e fiquei sentado ahahahah...

Depois de algumas fotos e cinco minutos de apreciação da vista desci, peguei minha cargueira e voltei pra Pedra das Flores, onde tinha uma família inteira de orientais montando uma tenda, e preparando um churrasco!!! Putz...deprimente...Espero que tenham levado todo lixo produzido...

(represa de Joanópolis vista do cume do Pico do Lopo)

Estava sozinho, cansado, relaxando na Pedra quando minha namorada me ligou e pediu que eu voltasse logo já que tinha conseguido os cumes tão rápido, e que estava morrendo de saudades. Óbvio não resisti rsrsrs...

Me preparei, bebi bastante água e fui. Após uma hora exata estava de volta a entrada da pousada, onde por sorte consegui uma carona que me deixou a apenas 3km da cidade descendo a estrada que subi na noite anterior.

Andei por mais uns 2km e quase no final consegui uma segunda carona até o final! Putz que sorte...rs

Ali mesmo fiz um lanche, e atravessei o quarteirão pra rodoviária, onde milagrosamente troquei minha passagem pra 15:30h do sábado mesmo! Em vinte minutos o ônibus partiria! Nossa, que sorte dupla! Cheguei em casa às 18:00h após menos de uma hora e meia de ônibus e mais um bocado de metrô, além da lotação no final pra chegar na minha rua...

Valeu a pena cada minuto, e foi uma experiência legal fazer a trilha sozinho pois pensei bastante sobre meu psicológico, o que foi bom. Houve momentos em que eu me peguei dando força pra mim mesmo! Meio doideira, mas isso aconteceu durante a subida da estrada que foi bem cansativa...

Combinei com um casal de amigos pro mês que vem subir o Camapuã e o Tucum na Serra do Mar.

Anotação importante: COMPRAR UMA CALÇA APROPRIADA O QUANTO ANTES!!! (preciso aposentar a minha calça camuflada que não serve pra montanhismo)

Custo total da viagem: R$ 38,00 (R$ 16,00 da passagem de ida + R$ 8,00 do lanche + R$ 14,00 da passagem de volta)

Na faixa!!!


terça-feira, 12 de agosto de 2008

Pedra da Mina - Serra Fina JUL2008

Vamos lá...Mais uma aventura.

Dessa vez resolvi subir a 4ª montanha mais alta do Brasil, sendo que em território 100% nacional ela é a 2ª, perdendo apenas para o Pico da Bandeira que fica na divisa ES/MG.

No primeiro fim de semana de julho, portanto ha mais de um mês, segui para Passa Quatro após combinar com meu amigo do RJ Alexandre e sua namorada Adriana para fazermos o ataque ao cume.

Saí de São Paulo na sexta-feira e após 4,5 horas cheguei na cidade, onde o Alexandre e a Adriana me esperavam de carro. Era meia noite e Já fazia frio, cerca de 5°C. Entrei no carro e pegamos a estrada.

Da Rodoviária pegamos a estrada de ferro da cidade e logo depois um desvio, quando acertamos a estrada de terra que nos levaria a Fazenda Serra Fina. Foram 20km de estrada de terra bem precária, e como o nosso carro era um corsa 1.0l, houve duas ocasiões em que fomos obrigados a descer do carro e empurrar! hahahahah...

Enfim, chegamos a Fazenda Serra Fina por volta de uma e meia da madrugada! Só havia mais um grupo liderado pelo Tacio acampado na entrada da fazenda, isso ajudou bastante porque acreditamos que ao chegar lá seria meio complicado acampar.

O grupo do Tacio saiu cedo, por volta de seis e meia. Nós demoramos mais a nos arrumar e só saímos oito da manhã! Após cerca de uma hora chegamos ao rio onde reabastecemos a água e continuamos após algumas fotos. A trilha é bem marcada apesar de ser bem cansativa.

Não demorou muito e já chegávamos a um mirante. Uma pequena clareira na mata que nos dava uma belíssima visão da Serra Fina, já com um desnível de aproximadamente 300 metros em relação a fazenda. A visão era linda...Continuamos depois de fotografar.

É engraçado como o corpo desidrata rápido na Serra Fina. Quanto mais baixo estamos, maior a oferta de água. Quanto mais alto estamos, menor a oferta de água (óbvio) e portanto o solo é mais árido. A sede é terrível, e parávamos pra beber água de vinte em vinte minutos. Mesmo assim, mesmo com o calor, fazia cerca de 10°C. Tiramos os casacos e continuamos.

As mochilas nem estavam tão pesadas assim, a minha e a do Alexandre com cerca de 20kg, e a da Adriana com menos, entre 10 e 15kg.

Após longas seis horas de trilha paramos para descansar logo depois do capim elefante, onde rola uma escalaminhada em pedra. Nesse momento estávamos exaustos, parecia interminável. Após tanto ler sobre a trilha (pesquisei por duas semanas antes de ir) cheguei a conclusão de que de fato ela merecia a reputação de ser muito exigente em relação a condicionamento físico. A minha única vantagem em relação ao Alexandre e a Adriana é o psicológico. Sou uma fonte interminável de incentivo (encheção de saco ahahahaha) e sempre os forcei a subir mais, em um ritmo mais lento pra que o cansaço levasse mais tempo pra nos pegar até pararmos por mais cinco minutos. Afinal de contas, não tínhamos pressa! Só queríamos o cume, depois voltaríamos pra acampar.



Enquanto almoçávamos fomos ultrapassados por um outro grupo que parecia ser local pelos sotaques, dentre eles havia um mais gordinho. Mais tarde percebemos tratar-se de um grupo que nao respeita nem um pouco a natureza. Mais pra frente explico...
Enfim, o almoço foi providencial, renovou minhas forças por completo! Me senti novo! E nada mais foi que meia horinha sentados e um miojo que parecia um talharim italiano legítimo! ahahahaha

Recomeçamos. Incrível, nem meia hora depois e já estávamos exaustos novamente, Adriana principalmente. Mesmo assim continuamos, demos uma parada antes da reta final e fomos.
Finalmente, perto do pôr do sol após nove horas de caminhada (acho que batemos o record de lentidão ahahahahah) chegamos ao cume. Algumas barracas já armadas o que impossibilitava o nosso camping ali mesmo porque os espaços vazios são cheios de pedras...Tacio e seu grupo estavam lá, batendo fotos e admirando a paisagem...
Nos limitamos a bater algumas fotos, poucas até, e quase que imediatamente iniciamos a descida. Nem sequer assinamos o livro!!!

É, uma besteira mas não assinamos. Adriana mal se aguentava de pé, Alexandre também estava exausto mas dava forças pra namorada, e eu feliz! Obviamente, muito cansado, quase sem forças. Mas a resistência ao frio da Adriana não é a mesma que eu tenho e que o Alexandre tem, resolvemos descer imediatamente pois o sol já já começaria a se pôr.



Tomamos nosso rumo de retorno. Descemos ao pré-cume, passamos pela montanha anterior, voltamos pelas pedras, passamos do capim elefante (estava meio lama, afundando as botas...) e logo chegamos a um pequeno descampado onde só cabe uma barraca. Ali mesmo acampamos. Essa descida levou cerca de uma hora. Foi rápido até...

Nesse descampado já tinha uma fogueira previamente feita, não gosto de fazer fogueiras porém se ela for feita com cuidado, nenhum acidente acontece. Reforçamos o contorno de pedras e queimamos alguns galhos secos pra Adriana se aquecer enquanto montávamos acampamento.
O sol se foi e com ele 15 graus de calor. A temperatura despencou de 16 a 17°C para apenas 1,5°C positivos às 19:00h! Era muito cedo pra fazer tanto frio...Depois percebemos porque de tanto frio, estavamos ao lado de um pequeno riacho (último ponto de água na subida), por isso toda mata a sua volta é bem úmida.

Mais frio, quando deu 20:00h fazia -1,4°C. Pelo menos a barraca estava montada, e agilizamos mais uma comidinha. Atum com sopa. Delícia, comida de deuses ahahahahah....

Nos aprontamos pra dormir, apagamos a fogueira e meia hora depois, devidamente embrulhados na barraca fomos dormir.
Durante a madrugada acordei várias vezes pra ver a temperatura. Deixei mei relógio pendurado do lado de fora da barraca e olha asempre que me lembrava (não consegui dormir muito bem mesmo). A última vez que olhei, era exatamente 03:14h e fazia: -8,2°C!
Muito frio, a barraca tinha gelo pra todo lado, eu não sentia minhas orelhas e percebi que estávamos muito frias e duras! Coloquei minha toca e voltei pra barraca mas não consegui tirar foto do relógio marcando a temperatura...

Quando amanheceu (por volta de 06:00h) levantei após uns 20 minutos de sol e comecei a bater fotos da barraca coberta de gelo. Foi divertido! Batemos várias fotos e só depois que o gelo derreteu começamos a tomar nosso café da manhã.

Depois do café, levantar acampamento, secar a barraca e seguir rumo a fazenda Serra Fina! Na volta a constatação desagradável. Aquele grupo que estava exatamente atrás de nós fez uma tremenda sujeirada na trilha! Largaram potes de cup noodles (recolhemos todos que vimos), embalagens de BIS que também pegamos, além de arroz dentro da fonte de água e vários, vários pedaços de papel higiênico, que apesar dos pesares, era o de menor problema visto que o papel é bio-degradável. Mas porra, custava ensacar e levar pra jogar fora em um local apropriado???

Em apenas cinco horas descemos, fazendo uma breve parada no rio, onde Adriana tomou um banho. Nessa parada o Tácio passou por nós com seu grupo e me disse que no cume pegaram -2°C. Quando disse a ele quanto pegamos ele se surpreendeu, achou estranho. Mas na verdade eu não acho muito difícil visto que eles estavam em um local muito seco e nós em um local muito úmido, cerca de 200 metros a menos de altitude.
Ainda na parada o grupo porcalhão chegou, pararam e também reabasteceram os cantis.
Um deles percebeu os sacos de lixo amarrados nas nossas mochilas e provavelmente viram os potes que eles mesmo largaram na trilha. Obviamente perceberam e não puxaram um assunto sequer, nem uma palavra!

Seguiram rumo junto do grupo do Tacio e sumiram na mata. Ainda ficamos mais alguns minutos e logo depois fomos. Quando chegamos na fazenda (meia hora depois) todos já haviam sumido.

Enfim, foi uma aventura legal, desafiadora, cansativa, e empolgante!

O próximo objetivo é a divisa de Extrema, Monte Verde e Joanópolis, subindo 4 picos. Mais leve porém com visual reconhecido!
Após essas montanhas, já agendei com um casal amigo em 26, 27 e 28 de setembro a subida dos picos Camapuã e Tucum na Serra do Mar, no Paraná.






É isso aí!

segunda-feira, 11 de agosto de 2008

O despertar para o montanhismo!


Vamos lá...

Essa História é verídica, nela conto como despertei para o montanhismo, mesmo sem ser essa a minha intenção na época.

Eu havia iniciado meu primeiro mochilão internacional em janeiro de 2007. Já era mochileiro de carreira tendo começado em 1996 com 19 anos de idade, mas agora seria minha primeira aventura fora do país, e tinha que valer a pena!

Após alguns pequenos problemas no início da viagem estava na cidade de Cochabamba na Bolívia onde conheci um peruano e um boliviano que tentavam chegar a La Paz também. Combinamos com um taxista uma corrida até La Paz por US$ 100.00, nada ruim para um trajeto tão longo, e dividiríamos o valor por três. Na Bolívia a regra é combinar um valor antes de sentar no táxi. A barganha também é importante e cultural por lá e por outros países da América do Sul.

Viagem à frente. Saímos do aeroporto de Cochabamba e logo logo nos vimos frente a frente com um bloqueio. Nada de saídas, não havia como escapar. Para todo lado que o taxista tentava, bloqueio. Estava pior do que imaginávamos, nos enfiamos no meio de uma crise social boliviana.

Após tentar sair do bloqueio por umas duas horas o taxista desistiu, e nos deixou onde estávamos mesmo. Pagamos somente 20 pesos bolivianos cada um e seguimos nosso rumo a pé.

Eu nunca tinha visto uma movimentação popular tão abrangente como aquela. Em um momento passávamos pela estrada onde havia pedras, montes de areia, pneus queimados e etc. Sobre um monte vi um papel grande escrito a mão, era uma mensagem de protesto. Claro, sendo Historiador pretendia registrar aquilo. Saquei minha máquina e fiz uma foto. Isso foi um erro! Fui cercado por pessoas que acreditavam que eu fosse um repórter, e queriam tomar minha máquina!

Foram cinco minutos tensos, e no meu paupérrimo portunhol, tive que dizer a todos que era Professor de História em uma viagem cultural pela América do Sul, e por isso registrava o acontecido, além de ser inteiramente a favor de todas as reivindicações que o povo dali fazia. Por fim me deixaram ir com minha máquina.

Esse foi só o começo. Em Cochabamba já há alguma altitude, cerca de 2.560 msnm. Minha mochila que pesava 16kg (descobri o peso total quando embarquei ainda no Rio de Janeiro para Santa Cruz) ainda não incomodava, mas iria incomodar!

Andamos por várias horas. No total cerca de 22 km! É muita caminhada a uma velocidade muito boa, e até então nunca havia caminhado tanto em minha vida. A noite caiu e com ela o frio chegou. A temperatura despencou de 20°C para 5°C, e cairia mais ainda.

O bloqueio estava bastante sério, centenas de caminhões parados nas estradas, milhares de pessoas protestando. No centro houve manifestações e uma pessoa foi morta, Cochabamba estava à beira de uma stasis social.

Durante a noite a caminhada ficou preocupante, pois não havia só pedras no chão, havia também espinhos! Galhos inteiros de espinhos que não eram espinhos normais, eram enormes! Espinhos com três ou quatro centímetros de comprimento, duros o suficiente para furar pneus, e eu ficava imaginando o estrago que seria capaz de fazer em um um pé. Peguei na mochila minha lanterna (item que não pode faltar), e fui iluminando o caminho para não parar em um hospital.

Finalmente encontrei uma parada de caminhoneiros na subida de uma montanha. Ali havia um pequeno restaurante, simples como todos na Bolívia, onde comi minha primeira refeição. Foi um prato de frango frito com arroz e salada de alface e tomate. Revigorante, maravilhoso, e me custou somente três bolivianos, menos de 50 cents de dólar!

Pedi permissão para o dono do estabelecimento para montar minha barraca de camping ali mesmo, e ele deixou sem exitar. Armei a barraca por volta de meia noite. Antes de dormir, combinei com um caminhoneiro uma carona pelas montanhas até La Paz, minha segunda tentativa de chegar a La Paz. Dormi até 04:00h, foram as piores quatro horas de sono que tive durante a viagem, fazia frio (cerca de 0°C), estava deitado praticamente no chão, tendo meu mochilão como travesseiro e a lona da barraca como cama. Acordei no horário programado, e segui viagem na caçamba do caminhão.

Montanha acima aqui vamos nós! Frio pela manhã, começamos a subir. Quando achava que já era o ponto mais alto, o caminhão fazia uma curva e havia um cume mais alto...nenhuma civilização, nenhuma construção, só o caminhão e estradas de terra montanha acima. Lá pelos 4.000 msnm, o caminhão não agüentava mais e superaquecia repetidamente. Não poderia mais continuar ali pois nada iria adiante. Por sorte, um caminhão carregado de uma colheita de milho passou, combinei uma carona e subi nele. A viagem continuava repleta de aventuras em estilo Indiana Jones! Até então não conseguira tomar um banho ainda. Já era o terceiro dia da viagem.

Continuamos no caminhão até que por fim ele alcançou uma estrada asfaltada, de ótima qualidade diga-se de passagem, que ligava os distritos bolivianos atravessando Cochabamba, Oruro e chegando a La Paz. Nela paramos por meia hora para almoçar. O cardápio era sopa de pollo (frango), dieta natural local e repetidamente oferecida pelo povo boliviano. Após o almoço cujo estabelecimento nem adianta indicar pois fica no meio de um pequeno povoado sobre as montanhas, seguimos viagem na auto-estrada rumo a La Paz.

Justamente quando eu pensava que o problema havia sido superado voltei a me preocupar. O bloqueio ainda estava firme, e as estradas estavam cheias de pedras que o povo montanhês rolava morro abaixo. O interessante é que o povo que vive nas montanhas não fala espanhol, eles ainda falam o dialeto primitivo Aymara, e a tentativa de contato com o povo boliviano que mora nas cidades não é muito bem sucedida, eles literalmente não se entendem! Chegamos a um bloqueio com cerca de cinquenta pessoas que vivem nas montanhas, e ali ficamos.

O dono do caminhão deu para as pessoas cerca de cem espigas de milho, mas não haveria mais negociação, sem chance. Mais uma vez, a viagem seria decidida na base da caminhada, só que dessa vez a 4.200 msnm. A mochila que pesava 16kg se transformara em um saco de cimento que parecia pesar 50kg. Era a altitude mostrando suas garras me avisando que o oxigênio é oferecido em escala consideravelmente menor. Apesar de ter sempre vivido ao nível do mar e ter rinite alérgica, surpreendentemente não fui afetado com a altitude em nenhum momento da viagem. A falta de oxigênio é normal, mas não foi tão difícil a ponto de me deixar fisicamente limitado.

Terceiro dia de viagem, meio dia. Caminhando nas montanhas de Cochabamba.
Foi um dia absurdo. Quando saí do Brasil estava com tersol na vista, que foi piorando cada vez mais até que o inchaço era tanto que a pálpebra estava pesada e o olho ficava meio entreaberto. A altitude fez seu papel e a mudança de pressão fez com que o tersol abrisse, expelindo toda secreção da inflamação, e em meia hora de caminhada meu olho fechava normalmente e estava consideravelmente melhor.

Não tinha água, só alguns pacotes de biscoito na mochila, que nem inspiravam o gasto de mais alguns newtons para tirar a mochila das costas. A caminhada foi colossal. Quando soube depois quanto andei não acreditava, andei mais 23km nessa altitude! Foi incrível, eram centenas de pessoas subindo as montanhas, centenas de pessoas descendo as montanhas. Milhares de carretas paradas porque não havia como passar e pedras, pedras para todo lado.

O sol era mito forte e eu tive queimadura de altitude no rosto. Não adiantava tirar o casaco pois pegava o frio próximo de zero que fazia durante o dia. Meu maior receio era ter que passar a noite ali e pegar temperaturas próximas a 15 ou 20 graus negativos sem estar preparado para tanto. Finalmente consegui chegar ao final do bloqueio onde passavam táxis a cada meia hora.
Na curva que parei havia uma placa na estrada determinando a altitude: 4.496 msnm. Minha primeira atividade montanhista por assim dizer, e cheguei nessa altitude. Nem acreditava...
Descansei um pouco, e após tanto problema, ironicamente peguei um táxi que por apenas 100 bolivianos que foram divididos entre eu e mais dois bolivianos e que fez uma corrida de 150km até Oruro.

Lá chegando, na noite do terceiro dia de viagem, pela primeira vez peguei um hotel que custou 80 bolivianos, e tomei meu primeiro banho na viagem. Estava exausto, e conseguira meu primeiro descanso após caminhar no total 45km, sofrer com o tersol e as queimaduras no rosto. O extremo de minha aventura. Dormi feito pedra por onze horas.

Essa foi minha primeira atividade em alta montanha. Sem programar, sem idealizar.
Ainda bem que tudo deu certo, ninguém saiu ferido, todos se entenderam, e eu consegui sair de Cochabamba.

De lá pra cá, fiquei fascinado pelas montanhas e comecei a investir na compra de equipamentos, bem como programar subidas...
Minha trajetória de sedentarismo foi devidamente encerrada!